terça-feira, 9 de março de 2010

Adélia Prado

Quando nasci, um anjo esbelto, desses que tocam trombeta, anunciou:

Vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado para mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.
Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree...
Já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável.
Eu sou.





Adélia Prado

Nenhum comentário: